Uma das mais celebradas, incompreendidas e polêmicas sagas da DC Comics,
virou tudo de cabeça para baixo, e muita gente ainda ficou perdida no
meio desse vendaval que foi a última das Crises. Mas não pense que a
culpa é dos leitores, a saga foi realmente confusa, seja pela narrativa
não linear de Grant Morrison, ou pela interferência editorial e a falta
de comunicação entre os autores envolvidos na mesma. Isso de fato não
vem ao caso, porque apesar dos pesares é uma grande história e merece
ser revisitada. Mas o fato é que a verdadeira história da Crise Final
não foi contada...
Vou tentar descrever de forma sucinta os fatos mais importantes e na
ordem correta dos acontecimentos para delimitar uma linha cronológica
dos eventos. O mal venceu. E com essa premissa, iniciou-se a última das
grandes Crises… para quem quisesse acreditar nessa afirmação.
Apesar das contagens regressivas e prelúdios, apesar da série principal e
de seus spin-offs, apesar de todas as pistas em histórias anteriores,
toda a expectativa gerada pela série “Os Sete Soldados da Vitória”, os
eventos que culminaram na Crise Final, além de não terem sido contados,
foram deturpados por versões diferentes de autores distintos. O grande
problema de comunicação ocorreu porque enquanto Grant Morrison bolava
sua mirabolante Crise Final, muitos outros autores utilizaram o tema em
outras publicações, mas isso gerou muitos erros de continuidade, o que
confundiu ainda mais a cabeça dos leitores. Pessoalmente, eu prefiro
acreditar que alguns fatos aconteceram em outras Terras, já que desde a
Crise Infinita ficou estabelecido o retorno não de infinitas, mas de
pelo menos 52 Terras paralelas. Isso descomplica um pouco a bagunça.
A série principal, conduzida por Grant Morrison segue todo o estilo
“surrefantástico” dele. Desculpe ter inventado essa palavra agora, mas
definir o trabalho do escritor escocês é uma tarefa meio complicada.
Então, digo que gostei muito da série, li (e reli) algumas vezes, juntei
peças dos quebra cabeças, voltei a edições antigas, perdi meu tempo
tentando encontrar algum sentido em “Contagem Regressiva” e “Prelúdio
para Crise Final”… e é sério, se quiserem ler essas duas últimas, fiquem
à vontade, mas elas não tem nada a ver com a Crise Final.
Por outro lado, “Sete Soldados da Vitória” faz muito sentido e ajuda
bastante a entender a saga. Agora, voltemos a premissa da Crise Final: O
mal venceu. Houve uma guerra entre Nova Gênesis e Apokolips, e
Darkseid levou a melhor. Matou seu filho Órion com uma bala de Rádion,
que voltou no tempo e o atingiu em cheio. Mas Darkseid e os outros Novos
Deuses não saíram dessa guerra ilesos… seus corpos foram destruídos, e
sua essência renasceu na Terra em avatares humanos, porém incapazes de
conter sua essência divina e por isso começaram a definhar lentamente.
Ao vencer a guerra, um debilitado Darkseid obteve o tão sonhado segredo
da Equação Antivida, e com ela espalhou sua mensagem de terror pelo
planeta, dominando as mentes de praticamente todos os habitantes da
Terra.
Uma versão futura de Metron dos Novos Deuses, já plenamente restaurada,
volta ao passado e entrega a Anthro, o primeiro menino da Terra, o
segredo do fogo e também o código genesiano que protege a mente humana
da antivida. Em determinado momento, também vindo do futuro, vemos
Kamandi, o ultimo menino da Terra, que vem até Anthro pedir que lhe
estregue essa arma contra os deuses.
Concomitamente,
os monitores do multiverso viram-se enfrentando crises particulares em
suas próprias Terras, e tendo que lidar com Mandrakk, o monitor
renegado, vampiro da existência que se alimenta daSangria,
(quem acompanhou a série “The Authority” da Wildstorm sabe do que se
trata). A Sangria é a “cola” que une os universos, delimitados pela Muralha da Fonte,
dependendo de que realidade você esteja olhando. Coube então ao
Superman salvar todas as Terras do Multiverso, derrotar Mandrakk, e usar
o elixir da vida retirado da Sangria para recuperar a saúde de Lois
Lane, que estava à beira da morte. E isso logo depois de ter voltado do
século XXX onde ajudou a Legião dos Super Heróis de 3 mundos a vencer o
Superboy Primordial e sua legião de supervilões. Mas ele não fez isso
sozinho… bom, hipoteticamente, o conceito do Superman existe em todas as
Terras, sendo ele representado por versões do Capitão Átomo, Dr.
Manhattan, Capitão Marvel, Apollo, Mr. Majestic, Supremo, os Supermen
nazista, soviético, e afro-americano presidente dos EUA, entre outros. Voltando
a sua própria Terra, Superman encontra o planeta em frangalhos,
dominado pelos “Justificadores” de Darkseid e à beira do colapso, com a
antivida se espalhando rapidamente.
Pouco antes da antivida dominar o mundo, Batman havia sofrido o Diabo
nas mãos do Dr. Hurt durante a saga “Descanse em Paz”, ele sobrevive a
queda de um helicóptero, volta para a caverna e mal tem tempo de se
recompor quando é chamado para o caso de “deicídio” – a morte de Órion.
Batman entra em ação ao investigar a morte do Novo deus; ele recolhe a
bala de Rádion, (uma substância “deotóxica”, capaz de matar os deuses do
Quarto Mundo), mas é capturado e usado como cobaia pelos cientistas de
Apokolips, e colocado numa máquina da Fábrica do Mal a fim de quebrar
seu espírito e torna-lo o modelo de um exército de fieis seguidores de
Darkseid. Alguns clones dele são gerados em laboratório, mas os
cientistas de Apokolips são sabiam onde estavam se metendo ao brincar
com a mente do homem morcego… ele não apenas se liberta da lavagem
cerebral como enfrenta Darkseid no mano a mano, e apesar de sua
repugnância em relação a armas, ele dispara contra o deus do mal,
atingindo-o em cheio. Porém essa bala volta no tempo e mata Órion na
edição 1 da série… Mas antes de morrer, Darkseid lhe aplica a Sanção
Ômega, “a morte que é vida”, cujo único que
conseguiu sobreviver foi o Sr. Milagre, justamente na saga dos Sete
Soldados da Vitória. Quase todos os clones de Batman gerados em
laboratório são destruídos, mas Superman encontra um deles e acredita
que seja o verdadeiro Bruce Wayne morto. Mas Batman é na verdade lançado
ao passado, onde é condenado a viver diversas encarnações de dor e
sofrimento. Sua primeira parada é na pré-história, onde encontra Anthro
já idoso com os símbolos de proteção à antivida pintados no rosto. Como
último estratagema de Darkseid, caso Batman consiga retornar, trará com
ele uma terrível ameaça de destruição de nível universal… Antes de
voltar do Século XXX, Brainiac 5 mostra ao Superman a “Máquina dos
Milagres”, um aparelho criado pelos “controladores”, uma espécie de
“primos” dos Guardiões do Universo, que mil anos no futuro conseguirão
construir esse aparelho numa tentativa de emular o poder dos anéis
energéticos de realizar a vontade de seus usuários, mas em nível
infinitamente superior. A máquina foi confiscada pela Legião e deixada
sob os cuidados de Brainiac 5, mas ele permite que Superman tenha um
vislumbre da mesma a fim de tentar reproduzi-la no século XXI.
Com o prévio conhecimento de como construir a tal máquina, e com o conhecimentoadquirido
com os monitores do Multiverso, Superman entoa uma determinada nota
musical que seria a grande geradora da vida, e com isso ativa a Máquina
dos Milagres, que realiza seu “desejo”, fazendo tudo voltar ao que era
antes, e concretizando um final feliz. Vemos então os Novos deuses de
Nova Gênesis ressuscitados em seus corpos originais, (embora seus
avatares na Terra continuem em ação, por isso temos ainda dois Senhores
Milagre, Scott Free e Shilo Norman – Vale lembrar que Shilo é um homem
negro, porém, nas páginas de Crise Final, ele aparece sem máscara e
vemos que além de branco ele tem traços orientais, e “concidentemente”
ele está na companhia do “Time Super Jovem”, heróis japoneses que são os
avatares do Povo da Eternidade na Terra. Grande escorregada do
desenhista, arte finalista e colorista da história, que confundiram
totalmente a etnia do personagem.
Com a aparente derrocada de Darkseid, os Novos Deuses recuperam sua
supremacia, Metron que estava usando como avatar um homem paraplégico
recupera sua centelha divina e inicia a retomada do seu poder. Esses
novos deuses se erguem em umQuinto Mundo onde,
contrariando a premissa inicial da Crise, o bem venceu. E é esse novo e
restaurado Metron do Quinto Mundo que volta no tempo e entrega a
proteção da equação antivida a Anthro, o primeiro menino da Terra, na
pré-história, e isso acontece na primeira página do primeiro número da
Crise Final.
E a Crise Final que NÃO foi contada, foi justamente a guerra dos deuses, onde Darkseidem
um primeiro momento de fato venceu. Só tivemos relances e relatos dessa
batalha, já pegando do ponto onde os deuses já estavam na Terra
debilitados e usando seus avatares humanos. Será que tal guerra não era
para ser presenciada por olhos humanos e mortais? Será que Grant
Morrison confiou que ela seria contada de forma decente nos Spin-offs da
saga, o que acabou sendo um amontado de histórias confusas e
desconexas? Teoricamente isso foi mostrado nos Spin-offs, mas nada
daquilo bate… principalmente porque ali, Órion morre numa batalha corpo a
corpo com seu pai e não pela bala de Rádion… fora o fato do Sr. Milagre
(Scott Free) de posse da equação antivida lutando com um ser que seria a
encarnação da “Fonte”… ah não…. só pode ser brincadeira. Isso foi em
outra Terra. Uma bem longe. E ponto Final.
As informações que surgiram na internet constam que esse recente
reboot/relauch da editora aconteceria logo após a Crise Final, porém os
editores voltaram atrás e decidiram manter o universo DC como estava por
um tempo… o que teria obrigado Morrison a mudar o final da saga as
pressas, o que deixou seu contexto ainda mais confuso. No novo universo
DC, vemos que a Liga da Justiça tem como inimigos justamente as forças
de Apokolips. Isso significa que o ”Quinto Mundo” foi desconsiderado? A
Crise Final não aconteceu? Bom, isso só saberemos com o desenrolar das
histórias. Recentemente Morrison revisitou a Crise Final nas histórias
do Batman, explicando alguns pontos obscuros, principalmente dessa
transição entre as sagas “Descanse em Paz” e “Crise Final”. E como a
cronologia do Batman foi uma das menos afetadas na nova DC, creio que
haverá uma ponte de ligação entre as duas realidades. Meu balanço final é
de que a ultima das Crises foi uma boa história, cheia de momentos climáticos, mas que infelizmente não alcançou o potencial a qual havia se proposto, prejudicando principalmente o seu desfecho.
O que eu gostaria mesmo era finalmente ler os fatos que antecederam a
derrocada dos deuses e então ler o verdadeiro final dessa história.
Nota: 5.2
Por Rodrigo Garrit
Fonte: Santuário.
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