Basta olhar os comentários das notícias recentes em qualquer site de games do Brasil, para perceber qual é o assunto polêmico do momento. Na mesma medida em que os DLCs se tornam uma realidade cada vez mais constante na indústria de games, também se tornam alvo de reclamações direcionadas, principalmente, a uma suposta ganância das empresas.
A discussão invadiu o mundo Resident Evil com Operation Raccoon City e o sexto game da série. O primeiro contou com uma série de pacotes de armas exclusivos de edições especiais ou lojas específicas, enquanto o segundo já tem mapas especiais para o modo Mercenaries servindo como brindes de pré-venda.
Entre gritos que acusam a Capcom de ser mercenária e estar utilizando uma tática desonesta para com seus fãs, há um grande espaço para discussão. Não dá pra amaldiçoar completamente o lançamento de DLCs, ao mesmo tempo em que também não é possível apoiar completamente a prática em alguns casos. Aqui, não há opinião certa e errada. Só é preciso entender como tudo funciona antes de aplaudir ou destruir.
Contendo o aumento nos gastos
O mercado atual de games tem um funcionamento muito parecido com o da indústria do cinema. Com os avanços da tecnologia, desenvolver um jogo se tornou muito caro. Para recuperar os muitos milhares de dólares gastos na produção de um grande título, as empresas dependem cada vez mais de números expressivos de vendagem para que possam fechar a conta no azul.
O problema é que esse fenômeno acontece em um ensejo que tem suas peculiaridades. Aumentar o preço dos títulos é uma decisão impopular e arriscada, pois os games para PlayStation 3 e Xbox 360, por exemplo, já são vendidos a US$ 59,99, um valor nada baixo. Com isso, o mercado de usados – que oferece jogos a valores bem mais baixos – ganha força nos EUA e Europa, enquanto a pirataria ainda domina os mercados emergentes.
Frente a esse dilema, uma das soluções encontradas pelas desenvolvedoras foi usar a infraestrutura online dos consoles e PCs para expandir a experiência dos games comprados em loja. Mediante pagamento, jogadores de todo o mundo poderiam ter acesso a capítulos adicionais, extras exclusivos e outros adicionais que tornavam os já caros títulos mais completos e atrativos.
As grandes redes varejistas também viram na novidade uma forma de fidelizar seus clientes. Perante a ameaça cada vez maior dos jogos digitais, as lojas começaram a firmar acordos com desenvolvedoras, garantindo vantagens especiais para quem realizasse a pré-compra dos títulos em sua rede. Os brindes, claro, eram DLCs exclusivos.
Como se tratam de expansões de fórmulas e utilizam engines já existentes, o custo de desenvolvimento de um adicional desse tipo é baixo. Sendo assim, os DLCs se tornaram um método bastante eficaz para multiplicar o faturamento oriundo dos jogos lançados em disco e se tornaram um dos principais motores do crescimento da distribuição digital de jogos. Foi aí que a coisa começou a piorar.
Perdendo a noção
A aceitação dos DLCs iniciais pelo público e os baixos custos envolvidos na produção deles deram início a uma verdadeira corrida do ouro, na qual o alvo eram os bolsos dos jogadores. No rol de DLCs, os extras consistentes passaram a ser substituídos por pequenos adicionais que traziam muito pouco valor. Uma simples alteração nas cores de roupas de personagens ou na tonalidade de armas – o “efeito metralhadora dourada” – era suficiente para que as desenvolvedoras já cobrassem. Qualquer trocado passou a valer a pena.
Em um determinado momento, os conteúdos adicionais passaram a ser anunciados antes mesmo dos títulos chegarem às lojas. Não dá para ser ingênuo a ponto de acreditar que esse tipo de extra tinha seu desenvolvimento iniciado apenas depois dos lançamentos, mas, pelo menos, se tinha a impressão de que estávamos levando para casa um produto completo. Esse, porém, não era mais o caso.
De forma a monetizar ainda mais os games, as desenvolvedoras também adotaram a prática de lançar novas edições de seus títulos, reunindo fisicamente todos os DLCs. As chamadas versões Gold, Complete ou Game of the Year também irritavam quem comprou no lançamento, pois uma edição muito mais completa estava disponível pelo mesmo preço pouco depois. Quem adquiriu o título e os extras saiu no prejuízo.
A crítica aqui, porém, muitas vezes é simplesmente egoísta. Edições integrais de games que os jogadores já possuem são execradas, com a desenvolvedora sendo taxada de mercenária, enquanto aquelas que o usuário ainda não comprou são dignas de grandes comemorações. O problema só existe, de verdade, quando o conteúdo extra é lançado apenas no formato físico, como foi o caso de Ultimate Marvel Vs. Capcom 3.
Criticando pelos motivos errados
Principalmente na comunidade brasileira, criou-se uma tendência a criticar a Capcom o tempo todo. A cada DLC anunciado, a cada nova edição divulgada, gamers de todo o país comparecem em fóruns e áreas de comentários taxando a empresa de mercenária e gananciosa, ocasionando um “mimimi” generalizado. Por algum motivo misterioso, o mesmo tratamento não é dado a outras desenvolvedoras que também agem de maneira semelhante.
Em reportagem, o site Destructoid concluiu que é preciso gastar US$ 870 (cerca de R$ 1630) para ter todos os DLCs de Mass Effect 3. Os conteúdos adicionais foram atrelados pela Electronic Arts à compra de artigos como bonecos, capas de console, cases para celular e toda sorte de produto licenciado. Todos anunciados antes mesmo da chegada do título às prateleiras.
A Activision também conta com uma abordagem agressiva de DLCs para seu principal título, Call of Duty: Modern Warfare 3. De forma a alavancar as assinaturas de seu serviço CoD Elite, a empresa criou entregas mensais de missões extras ou mapas para o modo multiplayer do game. Quem não quer ser um pagante deve esperar um pouco mais e tem a opção de pagar mais caro pelo conteúdo em um momento posterior.
Recentemente, a Rocksteady e a Warner Bros. anunciaram uma edição Game of The Year para o game Batman: Arkham City. O mesmo está prestes a acontecer com Uncharted 3: Drake’s Deception. As versões – que reúnem todos os DLCs lançadas até hoje – foram motivo de comemoração pelos fãs e não de ódio, como aconteceu com Resident Evil 5 Gold Edition.
Talvez por sermos fãs de Resident Evil e acompanharmos a empresa muito mais de perto do que as outras, temos a tendência de sermos mais críticos em relação a ela. Em comparação com a EA e a Activision, porém, ela nem abusa tanto assim dos conteúdos para download. Na maioria das vezes, as duras críticas às ações da empresa – e apenas a ela – não são justificáveis e representam uma dinâmica comum no mercado atual.
Por outro lado, há um fator pelo qual a Capcom merece todas as críticas possíveis. Em muitos dos grandes lançamentos recentes da empresa, como Resident Evil 5, Marvel Vs. Capcom 3 e Street Fighter X Tekken, foi descoberto que os conteúdos adicionais que chegariam como DLC após o lançamento do game já estavam presentes no disco.
Sendo assim, no momento em que o jogador adquiria o extra pela rede online, ele não estava comprando o conteúdo, e sim, um código que destravava algo que ele já possuía desde que comprou o game. Foi o caso com o modo Versus, de RE5, ou com os 12 personagens extras do crossover com a Namco Bandai, por exemplo.
A Capcom se justifica afirmando que a prática reduz o tempo de download e os custos de infraestrutura online. Na opinião da empresa, não há diferença alguma entre o conteúdo estar presente no disco e ser baixado, já que aquele extra específico nunca fez parte da edição original do game. A prática obrigou a desenvolvedora a prestar explicações perante o Better Business Bureau, espécie de PROCON americano.
O ódio é maior ao sul do mundo
O mercado de games brasileiro tem uma dinâmica um pouco diferente da existente nos Estados Unidos e Europa. Por aqui, todo e qualquer anúncio relacionado a DLCs é alvo de críticas e até mesmo conteúdos gratuitos são recebidos com negatividade pelos gamers. Os reais motivos para tantas reclamações, porém, muitas vezes acabam ocultos.
A pirataria, por exemplo, é um fator que, para muitos, impede o download mesmo de conteúdos gratuitos. Muitos dos adeptos dessa prática sabem que ela não é justificável e, sendo assim, criticam o fato de estarem sendo deixados de lado utilizando argumentos periféricos que, muitas vezes, passam longe de ter pé no bom senso. Desculpe, mas dizer que DLCs são ruins por que nem todos possuem consoles conectados à internet não é nada válido.
Uma prova desse fenômeno foi o lançamento de Resident Evil 5 Gold Edition. A chegada da versão estendida do game foi comemorada por usuários de Xbox 360 – que alegavam uma suposta dificuldade de acesso aos conteúdos online - para logo depois, perceberem que ainda assim teriam de fazer um download para ter acesso aos extras. Não foram poucos os emails revoltados que de donos do console da Microsoft que não teriam acesso aos novos capítulos mesmo comprando o game original.
O alto preço dos jogos, por outro lado, é sim um argumento que pode ser usado com propriedade, principalmente para criticar a política de DLCs já inclusos no disco. O câmbio entre o dólar e o real faz com que, muitas vezes, certos extras custem até um quarto do valor de um game novo e, caso muitos deles sejam lançados, não há carteira que aguente.
Há ainda aqueles que gosto de chamar de “turma de mimimi”, o grupo de fãs da série que gostam mesmo é de reclamar de tudo. Para esse pessoal, o anúncio de DLCs é um prato cheio para destilar todo tipo de veneno contra a Capcom, acusando-a de mercenária sempre que há a oportunidade. O problema é que essas mesmas pessoas reclamonas acabam comprando o conteúdo no dia do lançamento, incentivando a prática.
Futuro em partes (e o que fazer com relação a isso)
Por mais que a gente reclame, os DLCs estão aí para ficar. Para as empresas, eles são uma prática que dá certo e uma grande ajuda para ampliar o faturamento dos títulos. Até aí, até mesmo os gamers têm a ganhar, já que o sucesso de um game é garantia de que sequências serão produzidas.
O problema, de verdade, são as ofertas gananciosas, voltadas simplesmente à obtenção de lucro e com pouco valor real. É claro, o principal interesse das empresas não é a arte, e sim o dinheiro. Mas cabe a nós mostrar a elas que não aprovamos as práticas adotadas.
O posicionamento contra políticas abusivas de DLC é feito por meio de um boicote a elas, mostrando às desenvolvedoras que não estamos interessados em conteúdos sem substância e que foram feitos apenas para caçar níqueis. Apenas assim é possível mostrar insatisfação. Sua reclamação, mesmo que baseada em argumentos sólidos, tem um efeito minúsculo nesse aspecto.
O mimimi em comentários de sites e fóruns oficiais de nada adianta caso os conteúdos digitais continuem vendendo bem. No momento em que uma empresa tem em uma das mãos relatórios financeiros mostrando que seus DLCs foram um sucesso e em outra um bando de adolescentes reclamando sobre os conteúdos lançados, quem vocês acham que eles vão ouvir?
Autor- Evil Shady
Autor- Evil Shady
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