Resenha do encadernado “Tom Strong: A invasão das formigas gigantes”, com roteiro de Alan Moore, desenhos de Chris Sproug e arte-final de Karl Story.
Publicado no Brasil pela Pixel, esse especial trouxe também material adicional de Howard Chaykin, Shaw MCManus e Leah Moore.
Criado por Alan Moore e Chris Sprouse para o selo America´s Best Comics, foi um sucesso imediato e conquistou vários prémios, inclusive o Eisner, considerado um dos mais importantes dos quadrinhos.
Mas quem é Tom Strong?
Ele nasceu de uma união que já planejava o seu grandioso futuro. Seu pai cientista e a mãe liberal, viajaram em busca da lendária ilha de Attabar Teru. Durante uma tempestade, eles sobrevivem ao naufrágio e encontram o mítico lugar. Antes que o navio afundasse completamente, o cientista conseguiu retirar seus equipamentos de seu interior, com os quais construiu máquinas muito a frente de seu tempo, inclusive um autômato chamado Pneuman, e juntos ergueram uma pequena fortaleza tecnológica no centro de um vulcão adormecido.
Ao dar a luz, a mulher estava ciente de que não teria uma relação normal com seu filho. Ele foi criado dentro de um câmara com gravidade cinco vezes maior que a normal. O contato humano foi muito breve, pois para interagirem, seus pais precisavam usar roupas pressurizadas. O fato de ter crescido nesse ambiente artificial fez com que ele adquirisse força e resistência sobre-humanas, e desde cedo foi alimentado com raiz de Goloka, existente apenas nessa ilha e utilizada há várias gerações pela civilização local, o povo Ozu. Essa raiz contém propriedades extraordinárias… ela retarda consideravelmente o envelhecimento, concede força e vigor e também amplia a capacidade mental de seu usuário.
Desde o início, o intento do cientista Sinclair Strong e sua esposa Susan era realizar o experimento máximo de suas vidas… criar um ser humano aprimorado, que superasse todos os limites e expectativas. Seu filho.
Assim nasceu Tom Strong.
Tom Strong é considerado o maior herói da cidade Millennium City, e usa toda a sua perícia e conhecimentos científicos em prol da humanidade, ao lado de sua esposaDhalua, sua filha Tesla (também beneficiadas pelos efeitos da raiz de Goloka),Pneuman, o velho autômato criado por seu pai, Rei Salomão, um gorila super inteligente, e o atual namorado de Tesla, Val Var Garm, vindo de uma civilização subterrânea e capaz de entrar em combustão e controlar o fogo. Com cerca de cem anos de idade, Tom não aparenta mais do que quarenta e está em plena forma. Sua rotina envolve viagens através do tempo e Terras paralelas, incursões ocasionais à Vênus e muitas outras situações que beiram o impossível.
Na primeira história “Toque de Incêndio”, desenhada por Chris Sprouse, vemos uma invasão a residência de Tom Strong, e o sequestro de sua filha por um povo subterrâneo que mantém uma cultura rudimentar numa cidade escondida próximo ao centro da Terra. Esse povo possui propriedades de adaptação impressionantes, tendo a habilidade de suportar altas temperaturas e controlar o fogo. Nessa aventura Tesla conhece o jovem Val Var Garm, e depois do primeiro impacto do conflito cultural, descobre que suas intenções não são exatamente hostis.
O grande destaque do encadernado fica com a história “O ataque das formigas gigantes”, e apesar da premissa absurda, não deve ser subestimado. Quando Coleman Gray, um cowboy espacial chega para avisá-lo sobre a iminente invasão de uma raça de formigas gigantes do espaço à bordo de uma frota de naves do tamanho de continentes, Tom decide procurar velhos amigos e inimigos, e cobrar alguns favores na tentativa de preparar a Terra contra esse ataque. Alan Moore não deixa o leitor parar para respirar nem por um quadrinho. Tudo é uma ação que leva a uma reação, que gerará consequências a qualquer segundo. O tom da HQ é exagerado, propositalmente, pois o personagem é uma homenagem aos antigos “Pulps” americanos, histórias repletas de ação do começo ao fim que precederam os super-heróis, estrelados por alguns aventureiros como Doc Savage, O Sombra, The Bat e etc. E ele cumpre com maestria essa missão, escrevendo um roteiro dinâmico e inteligente, que apesar dos temas inverossímeis, nos fazem embarcar junto com os personagens nessa viagem ensandecida.
Como é de se esperar de Moore, existe aprofundamento, subtexto e referências incontáveis ao mundo da cultura pop, desde o Pulps até mesmo aos “comics”.
Chris Sprouse desenha lindamente, têm um estilo próprio, imprime personalidade nas páginas… ao contrário do artista Jacen Burrows que trabalhou com Moore na série “Neonomicon” da Avatar Press… Burrows é um desenhista correto, mas é só. Já Sprouse cria uma dinâmica, seu traço é firme, limpo, seguro. Ele sabe o que está fazendo e o faz muito bem.
Na HQ curta “A Eletrizante Terra das Mulheres”, desenhada pelo veterano e competentíssimo Howard Chaykin, a mensagem sobre misoginia fica clara, embora mostre de forma a nos fazer imaginar como seria um mundo dominado pelas mulheres, em que os homens seriam tratados com desdém.
Shawn MCManus desenha a história “Mau para os ossos” (acho que deveria ter sido traduzido como “Mau até os ossos“, mas deixa pra lá..) sobre Paul Saveen, um dos inimigos mais constantes de Tom Strong, que busca incessantemente pela imortalidade, não se importando com a pilha de corpos que deixa em seu caminho. Essa história foi escrita pela filha de Moore, Leah, e é correto dizer que ela aprendeu bem a lição com o papai. A história é bem estruturada, guarda as informações que só devem ser reveladas na hora certa e tem um tom perturbador típico das HQs do mago barbudo. Se ela um dia será uma escritora do mesmo nível dele, não sei (quem tem esse nível?), mas para uma primeira impressão (nunca tinha lido nada dela) confesso que fiquei positivamente impressionado.
Fechando o encadernado, mais um HQ curta, “O Estoque de Heróis de Horatio Hogg!“, também desenhada por Chris Sprouse, onde Tom e sua filha são aprisionados dentro de um… gibi! Bem, tecnicamente, a explicação é que se trata de uma “prisão bidimensional disfarçada de quadrinhos”… mas na prática, o que vemos são eles sendo encolhidos e sugados para dentro da revista, onde interagem com outros heróis que vivem lá… e podem manipular os recordatórios e legendas do gibi… a HQ mais surreal da edição (e ele tinha acabado de topar com formigas gigantes…) é também a mais descompromissada e divertida. Alan Moore diz que não importa o quanto uma história seja improvável, ela tem que ser escrita como se tivesse acontecido de verdade… tendo sucesso ou não, é preciso sempre ter isso em mente.
Tom Strong é uma leitura diferente de seus trabalhos mais famosos, como Watchmen e Monstro do Pântano… com certeza bem mais leve e descontraída, mas nem por isso deixa de ser uma excelente HQ, que mostra a versatilidade de Moore ao transitar através de vários temas distintos com a mesma qualidade.
Originalmente publicado no Santuário.
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